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You've got to be taught before it's too late,
Before you are six or seven or eight,
Como foi dito: não penses, olha!
Ludwig Wittgenstein, Investigações Filosóficas, 66, tradução de M.S. Lourenço
O essencial é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê,
Nem ver quando se pensa.
Alberto Caeiro, n'O Guardador de Rebanhos
Trying to enjoy my readin'
But you insist on interpretin' text
Nellie McKay, It's a Pose
Todos os anos acontece o mesmo. De um Inverno mais ou menos rigoroso – este ano especialmente chuvoso – passamos de repente a um sol radioso e a temperaturas surpreendentes. O resultado desta mudança abrupta de clima está bem visível nas ruas. Apesar da despedida (por enquanto, sem saudade) dos casacões, a desconfiança natural de que «logo pode estar frio» leva as raparigas às misturas de trapos mais duvidosas. É assim que observadores externos e sensatos experimentam momentos chocantes de perninhas deslavadas ao léu acompanhadas do angorá porque-nunca-se-sabe logo seguidos de outros não menos escandalosos com botas altas e collants opacos assistidos por um vestidinho de alças. O caos primaveril chegou às ruas da cidade, e este ano traz uma novidade que é ela própria o epítome desta incoerência: a sandália-botim. Quem terá inventado este híbrido medonho para pés femininos? As consequências estéticas da democratização deste modelo de sapato são aterradoras: baixinhas que ficam mais baixinhas e altas que nunca chegam a ter altura. A sandália-botim destrói a silhueta, e é um sapato mesmo feio. Aguardemos por melhores dias com a serenidade possível.
Publicado na Tabu, Cinco Sentidos, 16-4-10
Os bilhetes para a última tournée mundial de Madonna, «Sticky & Sweet», realizada entre Agosto de 2008 e Fevereiro de 2009, foram comprados por três milhões e meio de pessoas. Considerada a maior tournée realizada por um artista a solo, «Sticky & Sweet» ocupa o segundo lugar na tabela das mais lucrativas, com mais de 400 milhões de dólares arrecadados em 85 espectáculos. Aos cinquenta anos, Madonna é mais rentável que nunca. Os quatro concertos no estádio do River Plate, em Buenos Aires, resultaram no cd/dvd que é já imprescindível a qualquer fã que se preze. O mais divertido do espectáculo é ser uma exibição de bazófia. Durante cerca de duas horas, Madonna canta, toca e dança sem parar. E ao sétimo tema – de um total generoso de 26 – salta à corda. Madonna não suspira de cansaço, não faz uma única careta descontente, não se queixa. Quem corre vinte quilómetros por dia e por gosto não cansa. A pose de provocação é constante, com todos à sua volta e com o público, que acarinha e insulta. Numa atitude de desafio aos deuses, Madonna acaba o espectáculo com uma entrada no palco aos saltinhos. Como se nunca tivesse deixado de ser uma criança. Mil vezes bravo!
Publicado na Tabu, Cinco Sentidos, 16-4-10