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Meu caro amigo eu quis até telefonar
Mas a tarifa não tem graça
Eu ando aflito pra fazer você ficar
A par de tudo que se passa
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
Muita careta pra engolir a transação
E a gente tá engolindo cada sapo no caminho
E a gente vai se amando que, também, sem um carinho
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu bem queria lhe escrever
Mas o correio andou arisco
Se me permitem, vou tentar lhe remeter
Notícias frescas nesse disco
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
A Marieta manda um beijo para os seus
Um beijo na família, na Cecília e nas crianças
O Francis aproveita pra também mandar lembranças
A todo o pessoal
Adeus
* copyright Abrupto
... recordo o monárquico que era o meu Avô materno, natural de Guimarães, que pertencia «à situação», mas que era demasiado crítico de Salazar. Lembro-me dele na sua cadeira de balouço, a fazer aquilo de que mais gostava: a ler, a fumar imenso e a conversar. Era corajoso e gostava de paz. Os republicanos da família, sobretudo os de esquerda, gostavam muito dele e passavam tardes inteiras a falar com ele. Falam sempre do meu Avô com carinho e saudade.
Publicado na Tabu, Cinco Sentidos, 1-10-10
O discurso sobre a crise não é saudável. A dívida pública, o desemprego, a crise tomaram conta do ar de que precisamos para viver. As notícias sobre uma possível vinda do FMI, que nos poria a todos na ordem, sobre os juros da dívida a aumentar, e a falta de dinheiro em geral asfixiaram o quotidiano das pessoas. Em vez de nos ser dada tranquilidade para sair do buraco, somos confrontados com discursos que oscilam entre o optimismo delirante e o derrotismo irremediável. Depois de termos ouvido as recentes más notícias sobre o novo pacote de medidas de austeridade inserido no Orçamento de Estado para 2011, recordamos que era bom terem dito que não havia dinheiro para nada e que as contas estavam descontroladas. Que ia ser preciso cortar e fazer sacrifícios, a começar pela não renovação das frotas de automóveis dos organismos públicos. Mas não. Ninguém com responsabilidade governativa achou por bem fazer a coisa certa. E fazer a coisa certa, neste caso, não era difícil: consistia apenas em cumprir a obrigação de dizer a verdade aos portugueses. Não o tendo feito, o governo adiou medidas que agora se revelam dolorosas para todos. Cortes de salários na função pública e congelamento das pensões são duas dessas medidas que vão afectar directamente a vida das pessoas. O aumento do IVA para 23 por cento é outra que se prevê ter sucesso para ajudar a controlar o défice. Não sendo economista nem fiscalista, mas aproveitando o momento para declarar o meu repúdio pela discussão que nos obrigam a ter, diria que isso se calhar depende da despesa que se faz. Ora, se não há dinheiro para comprar nada, como espera o Estado receber mais de um imposto aplicado a bens de consumo? Para terminar o dia de pesadelo, Almeida Santos declarou que «o povo tem que sofrer as crises como o governo as sofre». Há uma mentira e um disparate nesta frase. A mentira é o governo sofrer como sofre o povo. O disparate consiste em pedir aos pacientes que entendam o sofrimento dos médicos. O que pensa das novas medidas de austeridade?
Publicado hoje no Metro. Deixe a sua opinião através do 21 351 05 90 ou no Jazza-me Muito. Os comentários que chegarem até quinta-feira, dia 7 de Outubro, às 15h, vão para o ar, na Rádio Europa, na sexta, dia 8, às 10h35.
Kate Moss
... a propósito do que escrevi aqui e aqui sobre estar apaixonado, um leitor enviou-me um YouTube em que é revelada a neurotreta em todo o seu esplendor. Helen Fisher dedicou a sua vida a estudar o cérebro de criaturas em estado de paixão e desenvolveu uma teoria que se baseia exclusivamente no estudo das reacções de uma condição inexplicável. Que os níveis de dopamina estejam mais elevados numa pessoa apaixonada não explica o seu estado. É como explicar a doença pelas suas reacções. Mas não explica porque é que nos apaixonamos por aquele e não por outro. Não indica, portanto, uma causa. Pior: trata possíveis efeitos como causas. A impossibilidade de explicação está, aliás, presente num exemplo dado por esta bióloga antropóloga, amante das TAC. Numa situação de sexo ocasional, pode acontecer que os tais níveis de dopamina subam. E? O exemplo ilustra a falta de consistência da sua teoria. Entretanto, ontem percebi que estar apaixonado e ter uma epifania são coisas diferentes. Há uma disposição para ter uma epifania que não existe no caso da paixão. Posto isto, não sei explicar porque é que me aconteceu o que me aconteceu e me fez mudar de ideias. Mas talvez, isso sim, para mudar de ideias, seja preciso estar num certo estado.