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Ao longo destes anos a escrever em jornais e revistas, tive a preocupação de perceber se o blogue estaria a concorrer com a publicação que me pagava pelo meu trabalho. Podia haver mais gente como eu, a comprar jornais e revistas só para ler as páginas de uma ou duas pessoas, não sei. Seja como for, por princípio, pensava que era errado colocar online um trabalho pelo qual fora paga e que não estava online. E ainda penso. Entretanto, os jornais mudaram e quase todos optaram por disponibilizar os seus conteúdos livremente na internet. Foi assim que passei a publicar aqui alguns dos textos que tinham sido publicados em papel. Nunca o fiz com grande prazer, devo dizê-lo. A partir do momento em que deixarem de estar de acesso livre online, deixo de os publicar no blogue. Enquanto vão estando nos sites, vou aqui pondo um ou dois dos cinco que escrevo para o SOL, como de costume, e um ou outro dos que escrevo para o i, sempre que a conversa o justifique.
Na edição do i de 6 de Agosto, Alexandre Homem Cristo referia dois motivos para a crescente quebra de vendas dos jornais. O primeiro teria que ver com a disponibilidade gratuita de notícias online, que levaria muitos leitores a prescindir da compra do jornal, e o segundo estaria relacionado com um hábito cada vez mais instalado na imprensa de relatar factos em vez de os investigar e questionar. Embora o tema seja demasiado sério para o mês de Agosto, penso que é urgente ser discutido.
Vou só falar do primeiro motivo que apresentou. A opinião geral sobre a presença dos jornais na internet é a de que ninguém sabe no que isto vai dar. A dúvida permanece há tempo suficiente para percebermos que o problema não está no fim do papel e numa mudança para o online. Com o aparecimento das aplicações para smartphones e tablets, pode ter surgido uma solução intermédia. Há a ideia de que tudo o que se ganha da internet é um ganho adquirido do zero. Mas e o investimento no caso da aplicações? Nada pequeno, se se pretender uma App bem feita. Ainda é cedo para conhecermos os resultados ditos positivos das assinaturas digitais. Mas sabemos que, entre Janeiro e Junho deste ano, houve menos 75 mil compradores de jornais do que no ano passado. Passaram todos a ler o jornal no iPad? Duvido. Onde estão, então, esses leitores e o que levou a que abandonassem o hábito de comprar jornais? Entre a televisão e o computador, a consumir as mesmas notícias.
Penso que houve um certo deslumbramento dos jornais com o online, que os terá impedido de perceber que estavam a dar os seus conteúdos em troca de nada. E os conteúdos, notícias, opinião, etc., têm valor e custam dinheiro. Este problema é, no meu entender, o mais sério com que a imprensa escrita se depara neste momento e que terá de resolver o quanto antes. Os jornais precisam de ter uma presença na internet, mas é urgente perceberem até que ponto estão dispostos a dar ao leitor, sob pena de ficarem sem nada para vender.
Vou dar um exemplo excêntrico. Tenho dois jornais preferidos. Um é o Times Literary Supplement e o outro é o London Review of Books. Ambos falam de livros. O primeiro é semanal e o segundo quinzenal. Como se constata pelas sublimes cartas dos leitores, o público é exigente. Os sites de ambos são simples e minimalistas. O TLS disponibiliza três ou quatro artigos por semana e uma das suas colaboradoras, Mary Beard, tem um blogue em que não fala sobre o que escreve no jornal. O LRB também oferece três ou quatro artigos durante uns dias (depois retira) e propõe a compra da edição online, provocando os leitores com os parágrafos iniciais dos restantes artigos. Só posso dizer que assino o TLS no Kindle (é muito mais barato) e choro sempre que o leio das saudades que tenho do jornal impresso em papel. O TLS no Kindle não tem imagens nem anúncios. Não é a mesma coisa...
O site tem de servir para atrair o leitor para a compra da edição online ou do jornal em papel. O online tem uma função: não é um fim em si mesmo.
* Artigo da Loja de Porcelana, publicado da edição de fim-de-semana do i, a 11-8-12. Recupero-o por causa da notícia recente das quebras muito preocupantes nas vendas de jornais.