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Diário invernoso (6)

por Carla Hilário Quevedo, em 03.03.18

- Tinha imensas perguntas para fazer aos intervenientes na conversa sobre o livro João Villalobos, Terapias, energias e algumas fantasias, mas há debates que simplesmente não toleram a moderação, nem em tom. Sobre o livro do João, tenho a dizer que está muito bem escrito, fala de charlatães com humor e regista os testemunhos das pessoas que acreditam nas terapias alternativas de um modo sério e respeitoso. Como diria Francisco, quem somos nós para julgar? Ouvi com atenção o Pedro Teixeira da Mota e o David Marçal e, apesar do confronto mais que evidente entre duas maneiras muito distintas de pensar, não identifiquei problemas insanáveis.

- A crítica mais que válida da ciência no que respeita às terapias alternativas centra-se no facto de as segundas estarem a reclamar um território que não lhes pertence e que, por muito que queiram, não merecem: o da prova. Uma experiência pessoal com Reiki ou acreditar na "má onda" (não sei como ninguém invocou esta sábia expressão!) de pessoas que temos o dever de evitar não são prova científica de nada. Indo directamente ao assunto: como é que os defensores das terapias alternativas podem resolver isto? Abandonando a necessidade de prova e assumindo que não são "alternativas", mas "complementares". Esta simples mudança nos termos pode ajudar a abrir o espaço à crença - porque, na verdade, é esse o campo deste tipo de terapias - e a deixar à ciência as provas, a refutação e, sobretudo, o progresso.

- Não podemos é negar que há cada vez mais pessoas a recorrer a métodos não convencionais de terapia. Uma médica presente contou que num estudo feito em 2003 na sua unidade hospitalar de tratamento da dor (uma questão altamente subjectiva) as conclusões foram que cerca de 30% dos pacientes usavam alguma forma de terapia não convencional. "Hoje em dia, a percentagem seria, talvez, de 70%", referiu. A explicação que deu foi também muito interessante: a relação entre médico e paciente mudou imenso. Há menos tempo para dedicar a cada pessoa, o que tem como consequência dar menos atenção a quem está vulnerável pela doença e, sobretudo, ser menos vigilante no que respeita à toma devida dos medicamentos. Concluindo, penso que o termo "alternativas" é altamente prejudicial para todos, porque induz as pessoas em erro. Não se trata de fazer Reiki em vez de tomar o antibiótico quando este é necessário, sendo certo que nem tudo na vida se resolve com comprimidos. Ora, se até a leitura dos diálogos de Platão tem efeitos terapêuticos tão modestos...

- Por falar em Platão, isto está bem feito. 

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publicado às 11:41