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- Por uma daquelas coincidências que uma expressão conhecida e mal citada não explica, no artigo de hoje, Miguel Esteves Cardoso fala sobre fake news, o tema sobre o qual pensei escrever aqui neste terceiro dia de estado de emergência. Fala sobre as causas da propagação das fake news: os viciados em atenção esperam influenciar os outros com a mentira; uma droga poderosa porque somos todos mentirosos e, por isso, todos desconfiados. Ontem, depois de receber pela vigésima vez a recomendação falsa sobre os benefícios de beber água morna e sal ou limão - devo dizer que à primeira caí que nem uma patinha, mas tive o bom senso de não partilhar -, e perante um comentário simpático de alguém que respondeu "mal não faz", desatei a correr no WhatsApp com a espingarda encostada ao peito. "Qual é o mal?", é a pergunta a que temos de responder. E o mal não é beber um chá de limão, nem bochechar com água morna e sal (para cicatrizar algum problema nas gengivas, e por recomendação do dentista). O mal é a mentira, podemos afirmar sem mais demoras. Mas porque é que a mentira é o mal, pergunta Cálicles. Porque a mentira relaxa as pessoas, filho, indo ao encontro precisamente do descanso por que tanto anseiam. Fá-las pensar que o bicho se mata com shots de vodka ou bicarbonato de sódio e depois esquecem-se de lavar as mãos. Keep calm e desliguem as notificações.
- Ainda sobre "o vício da atenção", é bastante evidente que estamos muito mais presentes nas redes sociais. Basta ver este blogue, deixado ao abandono em tempos de paz, que ganhou nova vida na pandemia. Estamos todos, mesmo os que não usam a mentira como engodo, a aproveitar-nos desta situação única de termos o público fechado e entediado em casa. Como padres que fecham a porta da igreja com recém-chegados lá dentro na esperança de os converterem.
- Entretanto, Stephen Sondheim fez também ontem 90 anos. Espero que esteja fechado em casa há pelo menos um mês, a escrever um musical... ou a descansar. Happy birthday Mr. Sondheim!
- Escrevi para o Ponto SJ sobre algumas reacções, muito boas e menos boas, a esta nova realidade pandémica que nos desafia a sermos melhores. Na bolsa dos comportamentos, há já quem caia a pique e quem ganhe pontos. Nada como um acontecimento avassalador - e repentino - para nos pôr à prova. Temos o campo aberto para a prática das virtudes, apesar da condicionante única de termos de viver à distância.
- Médicos, enfermeiros, cozinheiros, homens e mulheres que trabalham diariamente na recolha do lixo, caixas de supermercado, jornalistas, técnicos e todas as pessoas que estão a trabalhar neste momento "no terreno", fora de casa, para o resto da população poder estar recolhida, estão nas melhores condições para a prática das virtudes. Mas como vamos poder ser corajosos à distância, temperados à distância, magnânimes à distância? Há exemplos curiosos nas varandas de Nápoles, num país em que o vírus parece ter matado mais do que na China.
- É importante perceber por que razão a taxa de mortalidade é tão alta em Itália. Este artigo no Telegraph dá algumas explicações importantes. Também sobre a forma de combater a disseminação do vírus, gostei de ler este artigo na Atlantic.
- Entretanto, apareceram algumas fake news alegres, como as notícias sobre golfinhos nos canais límpidos de Veneza. É falso, mas ao menos é bem disposto.