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Diário da pandemia (12)

por Carla Hilário Quevedo, em 01.04.20

- Como é que não me lembrei da tuberculose, do bacilo de Koch, que matou que se fartou até Koch o descobrir? Claro que se pode ficar imune a uma bactéria e assim se confirma que a "empatia" descrita por Tucídides dos recuperados com os doentes, por terem passado pelo mesmo, nada mais era do que imunidade. Porém, esta interpretação não faz de Tucídides estúpido. Os gregos conheciam bem a anatomia. Hipócrates conhecia as veias, as artérias, o coração, segundo me contou o especialista numa consulta altamente produtiva ao telefone. Mas a Medicina, até chegar ao conhecimento do tratamento e da prevenção das doenças, demorou muitos séculos. Não imagino o que seria as pessoas adoecerem e morrerem sem se perceber minimamente o que tinham, sem se saber nada sobre o que estava a acontecer. Só isto é terrível.

"Mas foi febre tifóide ou tifo? Era uma salmonela ou um piolho?", perguntou.

"Era uma salmonela, Pai. Descobriram em 2016, não sei como. Seria qualquer coisa na água?"

"O piolho é que havia muito na guerra. Mas, sim, na água. Uma bactéria intestinal que se transmite pelos alimentos, está na terra, nas folhas e em tudo. O Péricles é que morreu numa peste."

"Foi nesta, Pai. Ele e uns quantos milhares de soldados. Ficaram sem exército para combater Esparta."

"Então foram derrotados pela doença!"

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publicado às 13:32

Diário da pandemia (11)

por Carla Hilário Quevedo, em 31.03.20

- A explicação pragmática era aquela que observamos ainda hoje. Os recuperados da febre tifóide ficavam imunes (vou ter de consultar um especialista para perceber como, uma vez que se trata de uma bactéria e não de um vírus), e por isso podiam aproximar-se dos doentes e cuidar deles. Mas, segundo percebo, esta imunidade não dura muito e houve um novo surto da dita peste três anos depois, em 427 a.C. Voltando à aproximação, que seria fatal para alguém saudável, também não se observava no caso dos predadores e aves de rapina. Os abutres desapareceram de Atenas. 

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publicado às 10:09

Diário da pandemia (10)

por Carla Hilário Quevedo, em 30.03.20

- Ontem acordei tarde porque dormi 11 horas seguidas e hoje para lá caminharia se não fosse o sempre agradável som de um martelo pneumático na minha cabeça de uma obra que não parou (e ainda bem). Há quem tenha insónias e há quem hiberne. Ambas são formas de lidar com isto (não sei bem caracterizar).

. Lembrei-me da Peste de Atenas, em 430 a.C., e fui ler o relato de Tucídides. A descrição na História da Guerra do Peloponeso é impressionante. Fiz algumas pesquisas para perceber o que terá sido (parecia ébola, por causa das hemorragias) e, ao que tudo indica, foi o primeiro surto de febre tifóide, vinda do Egipto e espalhada a partir do Pireu. Terá poupado o Peloponeso e dizimado Atenas. O dilema colocava-se entre tratar os doentes e ficar infectado ou não se aproximar e deixar morrer quem padecia da doença. Os recuperados eram os que conseguiam tratar os enfermos. Tucídides diz que as causas para este comportamento foram éticas e morais. Os recuperados tinham a experiência do sofrimento e por isso queriam ajudar os que sofriam. A explicação, porém, seria mais pragmática.

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publicado às 10:21